Agência Brasil — Ativistas que acompanharam a retirada de corpos de uma área de mata no Complexo do Penha, um dia após a maior operação policial realizada no Rio de Janeiro, classificam o evento como uma “chacina” e um “massacre” promovidos por forças de segurança. Já o governador do Rio, Cláudio Castro, afirma que as únicas vítimas são os policiais mortos.

O empreendedor Raul Santiago, nascido no Morro do Alemão, foi um dos primeiros a noticiar o encontro dos corpos. Ele usou transmissões ao vivo pelas suas redes sociais.
“Essa é a face da cidade maravilhosa, que é capital na América Latina quando a gente pensa em turismo. E eu amo a minha cidade, o meu estado, a minha favela, mas há esses momentos em que a desigualdade grita, o poder direciona o seu ódio e traz na prática mais brutal possível o seu recado para quem vive em comunidades como a nossa”, lamentou.
Mães de mortos questionam operação no Rio: “Arrancaram o braço dele”
Na manhã, a cena dos corpos enfileirados correram o Brasil e o mundo. Ao lado das dezenas de homens mortos durante a operação realizada ontem (28), estavam familiares, em sua maioria mulheres. Mães, irmãs e esposas que choravam ao redor dos corpos e questionavam a ação do Estado.
Uma delas era Elieci Santana, 58 anos, dona de casa. Ela conta que o filho Fábio Francisco Santana, de 36 anos, mandou mensagem dizendo que estava se entregando e compartilhando sua localização.
“Meu filho se entregou, saiu algemado. E arrancaram o braço dele no lugar da algema”, diz.
O relato de que muitos foram mortos mesmo depois de terem sido rendidos era comum entre as famílias que acompanhavam a movimentação na praça. Os corpos foram trazidos pelos próprios moradores, na caçamba dos carros, durante a madrugada.

Tortura
O presidente da associação comunitária de Parque Proletário, Erivelton Vidal Correa, confirmou sinais de tortura e execuções:
“Muitos corpos deformados, com perfurações no rosto, perfurações de faca, cortes de digitais, dois corpos decapitados, a maioria dos corpos não tinha face, essa era a condição”. Entre eles, o de dois irmãos manauaras. “Eles foram mortos abraçados com um tiro na cara cada um e tiveram as digitais cortadas”.
Contagem
Nessa terça-feira (28), dia da Operação Contenção, 64 mortos foram confirmados, incluindo quatro policiais. No entanto, pelo menos outros 70 corpos foram retirados por moradores de áreas de mata.
Seis foram localizados no Complexo do Alemão e deixados no Hospital Estadual Getúlio Vargas durante a noite, e outros 64 foram encontrados no Complexo da Penha e reunidos em uma praça da comunidade, de onde foram recolhidos posteriormente pelo Corpo de Bombeiros.
Se não houver duplicidade nos números e se todos os corpos encontrados realmente tiverem sido vítimas da operação, o número de mortos pode passar de 130.
“Tanto essas execuções, quanto os policiais que morreram, tudo isso [são] marcos históricos que gritam a ineficiência da política de segurança pública do Rio de Janeiro. Ou, pior que isso, a eficiência dela, a forma como ela é desenhada, estruturada, pensada e aplicada para lidar com algumas vidas”, afirmou Santiago.
“Da favela para dentro, tiro, porrada, bomba, invasão, desrespeito, chacina, massacre. Em outros endereços, o tratamento é quase vip”, criticou.
O presidente da organização não governamental Rio de Paz, Antônio Carlos Costa, também acompanhou a retirada dos corpos nesta manhã e pediu responsabilização do governador do estado, Cláudio Castro, pela tragédia. Ele lembrou, entretanto, que esse episódio se assemelha a muitos outros já ocorridos no estado.
“O que há de novo nesse massacre? Apenas a sua extensão, a quantidade de mortos… O que não há de novo é essa política de segurança pública, a destruição da vida do morador de comunidade. Quando ouvimos as respostas sobre a operação, ouvimos o que foi falado há 40, 50 anos atrás”, lamentou.
O governador do Rio de Janeiro, Claudio Castro, tem defendido a megaoperação. Segundo ele, a ação foi planejada ao longo de seis meses, como resultado de mais de um ano de investigações, contou com o aval do Poder Judiciário e foi acompanhada pelo Ministério Público do estado.






















