O sistema de pagamentos instantâneos brasileiro, Pix, está sob o escrutínio das autoridades dos Estados Unidos. Na quinta-feira (16), o Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR) anunciou a abertura de uma investigação formal sobre o estímulo governamental ao uso do Pix, entre outras ações comerciais brasileiras. A medida foi solicitada pelo próprio presidente Donald Trump.
A preocupação americana com a popularização do Pix, em uso no Brasil desde novembro de 2020, não é recente.
Há três anos, em 2022, o USTR já havia manifestado oficialmente seu monitoramento sobre os impactos do sistema. Em seu relatório anual sobre as perspectivas das exportações, o órgão declarou:
“Os Estados Unidos estão monitorando de perto os desenvolvimentos relacionados ao mercado de pagamentos eletrônicos de varejo no Brasil para garantir que o Banco Central [BC] brasileiro facilite condições equitativas para todos os participantes do mercado, dado o papel duplo do BC como regulador e operador do Pix, um serviço de pagamento de varejo em tempo real”.
Concorrência e “Barreiras Comerciais”
O relatório de 2022 do USTR foi o primeiro a mencionar nominalmente o Pix, classificando-o como uma potencial “barreira comercial estrangeira” com o potencial de afetar as exportações, investimentos e o comércio eletrônico dos EUA em 63 nações, incluindo o Brasil.
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A agência, que faz parte do gabinete executivo da presidência dos EUA e é responsável pela política de comércio internacional, ressaltou em seu recente comunicado que a investigação visa apurar “os ataques do Brasil às empresas de mídia social americanas, bem como outras práticas comerciais desleais que prejudicam empresas, trabalhadores, agricultores e inovações tecnológicas” dos Estados Unidos.
Analistas avaliam que as críticas do governo dos Estados Unidos podem ser explicadas pela concorrência que o Pix, um sistema de pagamento público e gratuito, impõe aos serviços oferecidos por operadoras de cartão de crédito tradicionais e ao WhatsApp Pay. O Pix tem se tornado inclusive uma alternativa ao dólar em algumas transações internacionais.
O fenômeno Pix e suas vantagens
Dados do Banco Central revelam o gigantismo do Pix: só no ano passado, o sistema movimentou cerca de R$ 26,4 trilhões. A economista Cristina Helena Mello, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), em entrevista à Agência Brasil, destacou as vantagens do sistema:
“O Brasil desenvolveu uma forma de meio de pagamento que oferece uma série de vantagens. O Pix é ágil, promoveu um processo de bancarização, de inclusão de pessoas que não tinham conta. E faz parte da lei de competência e de concorrência oferecer um produto cada vez melhor”.
Possíveis motivações e o caso WhatsApp Pay
Uma das possíveis razões para a reação tardia do governo Trump pode estar ligada à percepção de que o lançamento do Pix, em 2020, teria prejudicado os planos de negócios da Meta, empresa de Mark Zuckerberg e aliada de Trump.
Em junho de 2020, a Meta anunciou o lançamento da funcionalidade WhatsApp Pay no Brasil, que permitiria aos brasileiros enviar e receber dinheiro utilizando cartões de crédito pré-cadastrados no aplicativo.
No entanto, uma semana após o anúncio da Meta, o Banco Central e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) suspenderam a função.
A justificativa foi a necessidade de avaliar os riscos da operação, os potenciais riscos para a concorrência e garantir o funcionamento adequado do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB).
Cristina Helena Mello reforça a correção da medida do BC na época: “O WhatsApp criou uma forma de transferência de dinheiro de pessoas para pessoas, mas estava fazendo isso fora do sistema financeiro legal. Não estava fazendo com integração com o nosso sistema financeiro. Portanto, escapava da regulação do Banco Central, o que fere regras brasileiras de acompanhamento de transações monetárias”.