‘Carteiraço’ na Fesmate: vereador de Canoinhas é citado; conduta pode configurar crime
O vereador Cesar Ferreira de Almeida, conhecido como Cesão do Táxi (MDB), foi citado por ter usado sua condição de agente público para acessar um camarote privado durante um evento na Fesmate, no último fim de semana em Canoinhas.
De acordo com a organização da arena do rodeio country, Cesão chegou acompanhado de amigos e, ao ser informado de que o espaço era restrito a patrocinadores e convidados, teria se identificado como vereador e exigido a entrada.
Após a insistência, a entrada foi liberada para evitar tumulto, mas a situação foi considerada um desrespeito pela organização, que classificou o episódio como exemplo do chamado “carteiraço”.
Conduta é tipificada como crime
O ato não é apenas uma quebra de decoro. É enquadrado como crime de abuso de autoridade, segundo a Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019. O artigo 33 da norma estabelece punição para quem se utiliza do cargo ou invoca a função pública para obter vantagem a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação pessoal. A pena prevista é de detenção de seis meses a dois anos e multa.
Vereador fala em perseguição política e culpa “Amigos do Poder”
Procurado pela reportagem, o vereador Cesão do Táxi respondeu aos questionamentos sobre o ocorrido. Inicialmente, ao ser confrontado com a situação, ele reagiu com a frase: “Isso é palhaçada, né?”.
Posteriormente, por meio de mensagem, o parlamentar evitou responder diretamente a pergunta, preferindo um contra-ataque e classificando o episódio como uma manobra de perseguição política. “Mais uma mentira que estão tentando plantar contra aqueles que não rezam a cartilha do governo… quem tenta se utilizar do cargo pra se prevalecer, não sou eu!“, escreveu o vereador.
Diferentemente do que alega o parlamentar, a organização do evento confirma que a ‘carteirada’ ocorreu, sendo um dos organizadores a própria pessoa alvo da conduta.
Cesão ainda afirmou que sua entrada no camarote foi a convite. “Fui convidado pelo Alisson que estava no camarote e entrei“, justificou. Ele ainda acusou a existência de tratamento privilegiado apenas para políticos da base governista. “Uma vez que apenas os vereadores da situação tiveram acesso livre e irrestrito a todos os locais. Eu não, fiquei junto da população que me convidou.”
O vereador concluiu sua defesa se posicionando como vítima de uma retaliação política: “Continuo fazendo o meu trabalho e ajudando a população, mesmo que por inúmeras vezes os amigos do poder tentem me prejudicar… minha aliança não é com o poder é com o povo“.
A versão do parlamentar, no entanto, diverge frontalmente do relato da organização do rodeio, também ouvido pela reportagem.
Os responsáveis pelo evento reiteram que o espaço VIP era estritamente reservado a patrocinadores da Copa Brasil de Rodeio e para servidores que estavam trabalhando na organização da festa, e que o vereador teria invocado sua condição de agente público para forçar a entrada para si e para um grupo de pelo menos quatro amigos, sendo que posteriomente ainda tentou incluir mais pessoas.
A organização também reafirma que a conduta [carteiraço] de Cesão gerou incômodo, pois além do acesso indevido, ele insistiu repetidamente para que seu nome fosse anunciado nos auto-falantes:
“Ele pediu pra anunciar o nome dele e mandar um abraço, no sistema de som. E pediu que falasse várias vezes ainda“, relatou um membro da organização.
Foco no fato
De acordo com a legislação, a ação penal para esse crime é pública e incondicionada. Isso significa que o Ministério Público pode investigar o caso – através da apresentação de uma denúncia – independentemente da vontade ou da representação formal da vítima direta — neste caso, a organização do rodeio.
A lei entende que a vítima principal em casos de abuso de autoridade é a própria sociedade e o Estado, cuja confiança nos agentes públicos é abalada por tais atos. A conduta mancha a imagem da instituição que o vereador representa, neste caso, a Câmara Municipal de Canoinhas.
Em última mensagem à reportagem, o vereador admitiu indiretamente que houve a situação. Cesão do Táxi não disse “isso nunca aconteceu”, mas sim que, se houve, estaria dentro da legalidade: “Se a organização alega que me utilizei de alguma condição ou que eu não deveria estar lá, por qual motivo não me barraram? Se não agiram dessa maneira, significa que minha conduta foi rigorosamente dentro da lei e da ética” questionou.
Em tempo: Fonte jurídica ouvida pela reportagem explica que, em situações como essa, a organização poderia ter acionado a Polícia Militar, uma vez que o flagrante de abuso de autoridade pode levar à prisão.
Isso porque a legislação brasileira prevê que qualquer crime em flagrante autoriza a voz de prisão, seguida da condução do suspeito à delegacia para os procedimentos legais. A decisão de não adotar essa medida, contudo, pode ter representado uma opção de bom senso da organização do rodeio, evitando maior exposição do episódio e o envolvimento direto das autoridades em um evento de grande público.