STF decidirá se “ouvir dizer” pode ser usado como prova em Tribunal do Júri

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Corte Suprema analisará uso de relatos indiretos como base para envio a júri popular.

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O Supremo Tribunal Federal (STF) irá julgar se uma pessoa pode ser levada a júri popular com base apenas em depoimentos indiretos, conhecidos como testemunhos de “ouvir dizer” — relatos feitos por pessoas que não presenciaram o crime, mas apenas repetem o que ouviram de terceiros.

A decisão será tomada em Recurso Extraordinário, que teve repercussão geral reconhecida. Ou seja, o que for decidido valerá como orientação para casos semelhantes em todo o país.

O caso em análise envolve um homem que, já cumprindo pena por outro crime, foi acusado de ter ordenado o assassinato de dois supostos comparsas que teriam se recusado a traficar drogas para ele.

A denúncia foi baseada em relatos indiretos: a esposa de uma das vítimas contou que “ouviu dizer” que o crime teria relação com um envolvimento amoroso extraconjugal, enquanto a mãe da outra vítima alegou ter “ouvido dizer” que o réu fazia ameaças por telefone a partir da prisão.

Com base nessas declarações, o Ministério Público do Rio Grande do Sul pediu a pronúncia do réu — a etapa do processo que leva o acusado ao Tribunal do Júri.

No entanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus, entendendo que tais depoimentos não podem, por si só, fundamentar o envio do caso ao julgamento popular. O Ministério Público então recorreu ao STF.

A Defensoria Pública do Estado, que atua na defesa do réu, sustenta que os relatos são indícios frágeis e que usá-los como base para um processo penal fere o Código de Processo Penal. O uso de testemunhos indiretos, argumenta a defesa, compromete o direito ao contraditório e à ampla defesa, uma vez que não é possível questionar diretamente a fonte original da informação.

O relator do caso no STF, ministro Flávio Dino, destacou que a Corte deverá definir os limites do Tribunal do Júri e o que constitui uma prova legítima no processo penal brasileiro.

Dino também ressaltou que o conceito de “ouvir dizer” tem origem no sistema jurídico dos Estados Unidos — onde é conhecido como hearsay — e possui restrições bem estabelecidas, o que não ocorre de forma clara no Brasil.

A decisão do STF poderá estabelecer um importante precedente sobre o valor probatório de depoimentos indiretos e o equilíbrio entre o direito à acusação e a garantia de um julgamento justo. O julgamento ainda não tem data marcada.