Ao olhar para a fome, é importante lembrar que cada número representa a vida de uma pessoa. E que mudanças em percentuais de insegurança alimentar — ainda que pareçam pequenas — significam milhões de pessoas convivendo diariamente com a fome.
No fim de 2020, 19,1 milhões de brasileiros conviviam com a fome. Em 2022, são 33,1 milhões de pessoas sem ter o que comer. Os dados são do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, divulgados nesta quarta-feira (14).

Os dados foram coletados entre novembro de 2021 e abril de 2022, a partir da realização de entrevistas em domicílios de áreas urbanas e rurais de 577 municípios, distribuídos nos 26 estados e Distrito Federal.
FOME EM SANTA CATARINA
Enquanto 41,3% da população brasileira vive em condição de Segurança Alimentar, Santa Catarina se destaca com níveis superiores de acesso pleno aos alimentos, em relação ao país e às suas respectivas macrorregiões.
No Estado, 59,4% das famílias foram classificados com Segurança Alimentar, que ocorre quando todas as pessoas têm acesso permanente a alimentos seguros, nutritivos e em quantidade suficiente para satisfazer suas necessidades nutricionais.
De outro lado, 4,6% apresentaram Insegurança Alimentar Grave, ou seja, onde os moradores passam fome.

A taxa de Santa Catarina é a menor do país. No Brasil, a insegurança alimentar grave atinge 15,5% da população – número bem superior do registrado em Santa Catarina.
Entre aqueles com insegurança alimentar grave em Santa Catarina, 67,7% vivem com até meio salário, segundo o levantamento. O estudo explica que isto mostra que pessoas com baixos rendimentos são mais propensas a sofrerem com a insegurança alimentar.
FOME NO BRASIL
O número de domicílios com moradores passando fome saltou de 9% (19,1 milhões de pessoas) para 15,5% (33,1 milhões de pessoas). São 14 milhões de novos brasileiros/as em situação de fome em pouco mais de um ano. 8,2% das famílias relataram sensação de vergonha, tristeza ou constrangimento para garantir o que comer.
Ainda segundo a pesquisa, a maior proporção de famílias com insegurança alimentar no Brasil está no Norte e Nordeste. Alagoas foi o Estado que atingiu a maior proporção, com 36,7% das famílias pesquisadas em situação de insegurança alimentar grave.
A continuidade do desmonte de políticas públicas, a piora na crise econômica, o aumento das desigualdades sociais e o segundo ano da pandemia da Covid-19 mantiveram mais da metade (58,7%) da população brasileira em insegurança alimentar, nos mais variados níveis de gravidade.

A insegurança alimentar ocorre quando uma pessoa não tem acesso regular e permanente a alimentos. Ela é classificada em três níveis:
LEVE – Incerteza quanto ao acesso a alimentos em um futuro próximo e/ou quando a qualidade da alimentação já está comprometida
MODERADA – Quantidade insuficiente de alimentos
GRAVE – Privação no consumo de alimentos e fome
Apesar da alta cobertura do Programa Bolsa Família/Auxílio Brasil, em praticamente todos os estados da Federação, as famílias com rendimentos de até 1/2 salário mínimo não tiveram melhora significativa de suas condições de acesso à alimentação adequada.
Além disso, naqueles domicílios onde havia recebimento de recursos do Auxílio Brasil, comparativamente àqueles que não tiveram acesso a ele, a prevalência de Insegurança Alimentar Moderada + Grave , foi sistematicamente superior em quase todos os estados da Federação e no Distrito Federal.
Santa Catarina, estado com menor prevalência de Insegurança Alimentar, é também o único onde a presença do Auxílio Brasil se associou à menor proporção de Insegurança Alimentar moderada + grave, de forma significativa.
Contudo, possível identificar que, apesar da ampla cobertura do Auxílio Brasil, o programa não alcançou uma parcela significativa da população com renda de até 1/2 salário mínimo e que apresentava prevalências elevadas de Insegurança Alimentar, deixando excluídas, portanto, famílias socialmente elegíveis ao programa e, portanto, de alta vulnerabilidade alimentar.
Por outro lado, em domicílios com pelo menos um morador aposentado pelo INSS houve maior percentual de segurança alimentar (46,5%) e menor de fome (11,9%). A fome é mais frequente (16,7%) em moradias onde não há aposentados.
A pesquisa também mostra que a insegurança alimentar está presente em mais de 60% dos domicílios das áreas rurais. Desses, 18,6% das famílias convivem com a fome, valor maior do que a média nacional.
A pobreza das populações rurais, associada ao desmonte das políticas de apoio às populações do campo, da floresta e das águas, continua impondo a fome.



