O Ministério Público Federal (MPF) está em fase final de preparação para o julgamento do Caso Genivaldo de Jesus Santos, marcado para iniciar na próxima terça-feira (26), no Fórum Estadual da Comarca de Estância (SE), a 70 km de Aracaju.
A sessão do Tribunal do Júri vai julgar três ex-policiais rodoviários federais – William de Barros Noia, Kleber Nascimento Freitas e Paulo Rodolpho Lima Nascimento – acusados de tortura e homicídio triplamente qualificado contra Genivaldo Santos, de 38 anos, durante abordagem policial em Umbaúba, interior do estado, em 25 de maio de 2022. A previsão inicial é de que o Júri Popular dure sete dias corridos.

Genilvado foi parado pelos agentes por trafegar de moto sem capacete. Segundo o Instituto Médico Legal (IML) do estado, a vítima morreu de insuficiência aguda secundária a asfixia, após ficar 11 minutos e 27 segundos exposto a gases tóxicos e impedido de sair da viatura da PRF, segundo perícia feita pela Polícia Federal.
O esforço físico intenso e o estresse causados pela abordagem policial resultaram numa respiração acelerada de Genivaldo. Isso pode ter potencializado ainda mais os efeitos tóxicos dos gases. A perícia afirmou ainda, que os gases causaram um colapso no pulmão da vítima.
Repercussão
A morte ganhou projeção nacional e internacional por causa das imagens veiculadas na internet, que mostram a vítima presa dentro da viatura esfumaçada. Genivaldo se debate com as pernas para fora enquanto um policial rodoviário mantém a tampa do porta-malas abaixada, impedindo o homem de sair ou respirar.

Segundo a nota técnica divulgada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, “a morte de Genivaldo Jesus Santos chocou a sociedade brasileira pelo nível de sua brutalidade, expondo o despreparo da instituição em garantir que seus agentes obedeçam a procedimentos básicos de abordagem que orientam os trabalhos das forças de segurança no Brasil”.
Veja a cronologia
Por volta das 11h do dia 25 de maio de 2022, Genivaldo foi abordado por três policiais rodoviários no km 180 da BR-101.
- Segundo depoimento registrado no boletim de ocorrência (BO), os agentes o pararam por não usar capacete enquanto dirigia uma motocicleta
Imagens feitas por populares mostram quando os agentes pedem que ele coloque as mãos na cabeça e abra as pernas para a revista;
- Genivaldo obedece, mas mesmo assim, recebe spray de pimenta no rosto. A ação continuou no chão, quando dois policiais pressionaram o pescoço e o peito de Genivaldo com os joelhos.
O sobrinho da vítima, Wallison de Jesus, diz que avisou aos policiais que o tio tinha transtornos mentais. Ainda de acordo com ele, os agentes encontraram uma cartela de um medicamento controlado no bolso do tio, que fazia tratamento para esquizofrenia há cerca de 20 anos. Também segundo a família, Genivaldo era aposentado em virtude dessa condição.
- Wallison relata que o tio ficou nervoso e perguntou o que tinha feito para ser abordado. No BO, os policiais dizem que ele ficava passando a mão pela cintura e pelos bolsos e não obedecia às suas ordens e que, por isso, precisaram contê-lo. Segundo os agentes, os primeiros recursos foram spray de pimenta e gás lacrimogêneo;
Um vídeo mostra quando um dos agentes tenta imobilizar Genivaldo com as pernas no pescoço. No chão, ele é algemado e tem os pés amarrados;
- Em seguida, Genivaldo é colocado no porta-malas do carro da PRF, que está com os vidros fechados. Os policiais jogam uma bomba de gás e fecham o compartimento.
- Genivaldo se debate, com os pés para fora do porta-malas, enquanto os policiais pressionam a porta.
No boletim de ocorrência, os policiais dizem que o homem teve um “mal súbito” no trajeto para a delegacia e foi levado para o Hospital, onde morreu por volta das 13h;
- O corpo foi recolhido pelo Instituto Médico-Legal de Sergipe e chegou a Aracaju às 16h58. Um laudo do órgão aponta que Genivaldo morreu por asfixia mecânica e insuficiência respiratória aguda;
- Por volta das 18h, a Polícia Rodoviária Federal se pronunciou, informando ter aberto um procedimento para apurar o caso.
- O corpo de Genivaldo foi sepultado em Umbaúba por volta das 11h do dia seguinte, 26 de maio. Ele deixou esposa e um filho e oito anos.
O processo do Caso Genivaldo Santos foi incluído no Observatório de Causas de Grande Repercussão, instituído pelo Conselho Nacional de Justiça e pelo Conselho Nacional do Ministério Público, que acompanha situações concretas de alta complexidade, grande impacto e elevada repercussão ambiental, econômica e social, como os desastres com barragens em Mariana e Brumadinho (MG) e o incêndio na Boate Kiss em Santa Maria (RS), entre outros .
Este é o primeiro Tribunal do Júri realizado na Justiça Federal em Sergipe em 21 anos. O último julgamento deste tipo ocorreu em outubro de 2003, quando um homem foi condenado por tentativa de homicídio contra um médico-perito do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), após ter tido um benefício negado pela instituição.
Participarão do julgamento cinco procuradores da República, incluindo três procuradores integrantes do Grupo de Apoio ao Tribunal do Júri.
O grupo é uma unidade nacional do MPF, convocado a pedido do procurador responsável pelo caso, para atuação em casos de alta complexidade.
Conheça as etapas do julgamento no Tribunal do Júri
1 – Entre jurados convocados pela Justiça Federal, haverá sorteio para composição do Conselho de Sentença. O Ministério Público e a defesa dos réus poderão dispensar até três jurados sorteados sem apresentar justificativa. Ao final, sete jurados participarão do julgamento.
2 – Os jurados recebem o relatório do processo e outros documentos do caso.
3 – São ouvidas as testemunhas indicadas pelas partes, peritos e realizado o interrogatório dos réus. Os jurados poderão fazer perguntas para melhor se convencer dos fatos.
4 – Em seguida, começam os debates entre a acusação e a defesa. Inicialmente, falam pela acusação os membros do Ministério Público e advogados da assistência da acusação.
5 – Os advogados dos réus apresentam, então, as defesas.
6 – Os membros do Ministério Público e os advogados podem voltar a debater com direito a réplica e tréplica.
7 – Ao final dos debates, o juiz formula os quesitos (perguntas diretas) que serão votados secretamente pelo Conselho de Sentença. As decisões são tomadas por maioria.
8 – A votação é feita em uma sala especial longe dos acusados e do público e se dá por meio de cédulas. Os votos são contabilizados pelo juiz.
9 – Ao final da votação, cabe ao juiz proferir a sentença de absolvição ou condenação, e, nesse último caso, estabelecer as penas.